segunda-feira, novembro 01, 2010

O Guardador de Rebanhos



XXI


Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe um paladar,
Seria mais feliz um momento...
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural...

Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva...

O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja...

Alberto Caeiro

domingo, outubro 31, 2010

Rediscutindo o Anarquismo



O historiador sul-africano Lucien Van der Walt (fundador da Zabalaza
Anarchist Communist Front – ZACF) estará no Brasil nos próximos dias e participará de eventos para a discussão do livro que escreveu em
...co-autoria com Michael Schmidt. “Black Flame: The Revolutionary Class Politics of Anarchism and Syndicalism” [A Chama Negra: a política
revolucionária e classista do anarquismo e do sindicalismo] foi
publicado pela AKPress dos EUA em 2009 e aguarda publicação em outros
idiomas.

Considerado por muitos o melhor livro de história do anarquismo já
publicado, “Black Flame” é fruto de um trabalho de 10 anos, possui uma análise global e discute anarquismo e sindicalismo no mundo todo,
tanto a partir de uma análise política/sociológica, como histórica. Um dos únicos livros que baseia suas conclusões em análises dos
acontecimentos que envolveram o anarquismo e o sindicalismo em todos os cantos do mundo, incluindo o Brasil.

Trata de diversos temas: (re)definição do que é anarquismo, a partir
de uma análise histórica bastante completa e não-eurocêntrica; a
discussão dos primeiros tempos com as primeiras concepções da análise social; estratégia e tática diferenciando as duas principais linhas do
anarquismo, o anarquismo de massas e o anarquismo insurrecionalista; anarquismo e sindicalismo; luta armada e violência; sindicalismo
duplo, reformas e debates táticos; organização política anarquista;
classe, internacionalismo, gênero, raça e imperialismo.

Bakunin e o sufrágio universal


A Ilusão do Sufrágio Universal

Mikhail Bakunin, in Ouvres, Vol. II, 1907.



Os homens acreditavam que o estabelecimento do sufrágio universalgarantia a liberdade dos povos. Mas infelizmente esta era uma grande ilusão e a compreensão da ilusão, em muitos lugares, levou à queda e à desmoralização do partido radical. Os radicais não queriam enganar opovo, pelo menos assim asseguram as obras liberais, mas neste caso eles próprios foram enganados. Eles estavam firmemente convencidos quando prometeram ao povo a liberdade através do sufrágio universal.Inspirados por essa convicção, eles puderam sublevar as massas e derrubar os governos aristocráticos estabelecidos. Hoje depois de aprender com a experiência, e com a política do poder, os radicais perderam a fé em si mesmos e em seus princípios derrotados e corruptos. Mas tudo parecia tão natural e tão simples: uma vez que os poderes legislativo e executivo emanavam diretamente de uma eleição popular, não se tornariam a pura expressão da vontade popular e não produziriam a liberdade e o bem estar entre a população?

Toda decepção com o sistema representativo está na ilusão de que um governo e uma legislação surgidos de uma eleição popular deve e pode representar a verdadeira vontade do povo. Instintiva e inevitavelmente, o povo espera duas coisas: a maior prosperidade possível combinada com a maior liberdade de movimento e de ação. Isto significa a melhor organização dos interesses econômicos populares, e a completa ausência de qualquer organização política ou de poder, já que toda organização política se destina à negação da liberdade. Estes são os desejos básicos do povo. Os instintos dos governantes, sejam legisladores ou executores das leis, são diametricamente opostos por estarem numa posição excepcional.

Por mais democráticos que sejam seus sentimentos e suas intenções, atingida uma certa elevação de posto, vêem a sociedade da mesma forma que um professor vê seus alunos, e entre o professor e os alunos não há igualdade. De um lado, há o sentimento de superioridade, inevitavelmente provocado pela posição de superioridade que decorre da superioridade do professor, exercite ele o poder legislativo ou executivo. Quem fala de poder político, fala de dominação. Quando existe dominação, uma grande parcela da sociedade é dominada e os que são dominados geralmente detestam os que dominam, enquanto estes não têm outra escolha, a não ser subjugar e oprimir aqueles que dominam. Esta é a eterna história do saber, desde que o poder surgiu no mundo. Isto é, o que também explica como e porque os democratas mais radicais, os rebeldes mais violentos se tornam os conservadores mais cautelosos assim que obtêm o poder. Tais retratações são geralmente consideradas atos de traição, mas isto é um erro. A causa principal é apenas a mudança de posição e, portanto, de perspectiva.

Na suíça, assim como em outros lugares, a classe governante é completamente diferente e separada da massa dos governados. Aqui, apesar da constituição política ser igualitária, é a burguesia que governa, e é o povo, operários e camponeses, que obedecem suas leis. O povo não tem tempo livre ou educação necessária para se ocupar do governo. Já que a burguesia tem ambos, ela tem de ato, se não por direito, privilégio exclusivo. Portanto, na Suíça, como em outros países a igualdade política é apenas uma ficção pueril, uma mentira.

Separada como está do povo, por circunstâncias sociais e econômicas,como pode a burguesia expressar, nas leis e no governo, os sentimentos, as idéias, e a vontade do povo? É possível, e a experiência diária prova isto. Na legislação e no governo, a burguesia é dirigida principalmente por seus próprios interesses e preconceitos, sem levar em conta os interesses do povo. É verdade que todos os nossos legisladores, assim como todos os membros dos governos cantonais são eleitos, direta ou indiretamente, pelo povo.

É verdade que, em dia de eleição, mesmo a burguesia mais orgulhosa, se tiver ambição política, deve curvar-se diante de sua Majestade, a Soberania Popular. Mas, terminada a eleição, o povo volta ao trabalho,e a burguesia, a seus lucrativos negócios e às intrigas políticas. Não se encontram e não se reconhecem mais. Como se pode esperar que opovo, oprimido pelo trabalho e ignorante da maioria dos problemas, supervisione as ações de seus representantes? Na realidade, o controle exercido pelos eleitores aos seus representantes eleitos é pura ficção, já que no sistema representativo, o controle popular é apenas uma garantia da liberdade do povo, é evidente que tal liberdade não é mais do que ficção.

terça-feira, outubro 05, 2010

"Marcos é gay em São Francisco, negro na África do Sul, asiático na Europa, hispânico em San Isidro, anarquista na Espanha, palestino em Israel, indígena nas ruas de San Cristóbal, roqueiro na cidade universitária, judeu na Alemanha, feminista nos partidos políticos, comunista no pós-guerra fria, pacifista na Bósnia, artista sem galeria e sem portfólio, dona de casa num sábado à tarde, jornalista nas páginas anteriores do jornal, mulher no metropolitano depois das 22h, camponês sem terra, editor marginal, operário sem trabalho, médico sem consultório, escritor sem livros e sem leitores e, sobretudo, zapatista no Sudoeste do México. Enfim, Marcos é um ser humano qualquer neste mundo. Marcos é todas as minorias intoleradas, oprimidas, resistindo, exploradas, dizendo ¡Ya basta! Todas as minorias na hora de falar e maiorias na hora de se calar e agüentar. Todos os intolerados buscando uma palavra, sua palavra. Tudo que incomoda o poder e as boas consciências, este é Marcos." - 'Marcos' é como todos os membros do Exército Zapatista de Libertação Nacional dizem se chamar pra esconder seus rostos.

segunda-feira, setembro 27, 2010

Sigo revolucionário - Eu reacionário... com minhas ideias turbulentas.

Miséria, opressão e resistência popular

Chomsky e as 10 estratégias de manipulação midiática.

Noam Chomsky elaborou a lista das “10 estratégias de manipulação” através da mídia:

1- A ESTRATÉGIA DA DISTRAÇÃO.
O elemento primordial do controle social é a estratégia da distração que consiste em desviar a atenção do público dos problemas importantes e das mudanças decididas pelas elites políticas e econômicas, mediante a técnica do dilúvio ou inundações de contínuas distrações e de informações insignificantes. A estratégia da distração é igualmente indispensável para impedir ao público de interessar-se pelos conhecimentos essenciais, na área da ciência, da economia, da psicologia, da neurobiologia e da cibernética. “Manter a atenção do público distraída, longe dos verdadeiros problemas sociais, cativada por temas sem importância real. Manter o público ocupado, ocupado, ocupado, sem nenhum tempo para pensar; de volta à granja como os outros animais (citação do texto ‘Armas silenciosas para guerras tranqüilas’)”.

2- CRIAR PROBLEMAS, DEPOIS OFERECER SOLUÇÕES.
Este método também é chamado “problema-reação-solução”. Cria-se um problema, uma “situação” prevista para causar certa reação no público, a fim de que este seja o mandante das medidas que se deseja fazer aceitar. Por exemplo: deixar que se desenvolva ou se intensifique a violência urbana, ou organizar atentados sangrentos, a fim de que o público seja o mandante de leis de segurança e políticas em prejuízo da liberdade. Ou também: criar uma crise econômica para fazer aceitar como um mal necessário o retrocesso dos direitos sociais e o desmantelamento dos serviços públicos.

3- A ESTRATÉGIA DA GRADAÇÃO.
Para fazer com que se aceite uma medida inaceitável, basta aplicá-la gradativamente, a conta-gotas, por anos consecutivos. É dessa maneira que condições socioeconômicas radicalmente novas (neoliberalismo) foram impostas durante as décadas de 1980 e 1990: Estado mínimo, privatizações, precariedade, flexibilidade, desemprego em massa, salários que já não asseguram ingressos decentes, tantas mudanças que haveriam provocado uma revolução se tivessem sido aplicadas de uma só vez.

4- A ESTRATÉGIA DO DEFERIDO.
Outra maneira de se fazer aceitar uma decisão impopular é a de apresentá-la como sendo “dolorosa e necessária”, obtendo a aceitação pública, no momento, para uma aplicação futura. É mais fácil aceitar um sacrifício futuro do que um sacrifício imediato. Primeiro, porque o esforço não é empregado imediatamente. Em seguida, porque o público, a massa, tem sempre a tendência a esperar ingenuamente que “tudo irá melhorar amanhã” e que o sacrifício exigido poderá ser evitado. Isto dá mais tempo ao público para acostumar-se com a idéia de mudança e de aceitá-la com resignação quando chegue o momento.

5- DIRIGIR-SE AO PÚBLICO COMO CRIANÇAS DE BAIXA IDADE.
A maioria da publicidade dirigida ao grande público utiliza discurso, argumentos, personagens e entonação particularmente infantis, muitas vezes próximos à debilidade, como se o espectador fosse um menino de baixa idade ou um deficiente mental. Quanto mais se intente buscar enganar ao espectador, mais se tende a adotar um tom infantilizante. Por quê?“Se você se dirige a uma pessoa como se ela tivesse a idade de 12 anos ou menos, então, em razão da sugestionabilidade, ela tenderá, com certa probabilidade, a uma resposta ou reação também desprovida de um sentido crítico como a de uma pessoa de 12 anos ou menos de idade (ver “Armas silenciosas para guerras tranqüilas”)”.


6- UTILIZAR O ASPECTO EMOCIONAL MUITO MAIS DO QUE A REFLEXÃO.
Fazer uso do aspecto emocional é uma técnica clássica para causar um curto circuito na análise racional, e por fim ao sentido critico dos indivíduos. Além do mais, a utilização do registro emocional permite abrir a porta de acesso ao inconsciente para implantar ou enxertar idéias, desejos, medos e temores, compulsões, ou induzir comportamentos…

7- MANTER O PÚBLICO NA IGNORÂNCIA E NA MEDIOCRIDADE.
Fazer com que o público seja incapaz de compreender as tecnologias e os métodos utilizados para seu controle e sua escravidão. “A qualidade da educação dada às classes sociais inferiores deve ser a mais pobre e medíocre possível, de forma que a distância da ignorância que paira entre as classes inferiores às classes sociais superiores seja e permaneça impossíveis para o alcance das classes inferiores (ver ‘Armas silenciosas para guerras tranqüilas’)”.

8- ESTIMULAR O PÚBLICO A SER COMPLACENTE NA MEDIOCRIDADE.
Promover ao público a achar que é moda o fato de ser estúpido, vulgar e inculto…

9- REFORÇAR A REVOLTA PELA AUTOCULPABILIDADE.
Fazer o indivíduo acreditar que é somente ele o culpado pela sua própria desgraça, por causa da insuficiência de sua inteligência, de suas capacidades, ou de seus esforços. Assim, ao invés de rebelar-se contra o sistema econômico, o individuo se auto-desvalida e culpa-se, o que gera um estado depressivo do qual um dos seus efeitos é a inibição da sua ação. E, sem ação, não há revolução!

10- CONHECER MELHOR OS INDIVÍDUOS DO QUE ELES MESMOS SE CONHECEM.
No transcorrer dos últimos 50 anos, os avanços acelerados da ciência têm gerado crescente brecha entre os conhecimentos do público e aquelas possuídas e utilizadas pelas elites dominantes. Graças à biologia, à neurobiologia e à psicologia aplicada, o “sistema” tem desfrutado de um conhecimento avançado do ser humano, tanto de forma física como psicologicamente. O sistema tem conseguido conhecer melhor o indivíduo comum do que ele mesmo conhece a si mesmo. Isto significa que, na maioria dos casos, o sistema exerce um controle maior e um grande poder sobre os indivíduos do que os indivíduos a si mesmos.


Retirado de: http://difusaolibertaria.wordpress.com/2010/09/01/chomsky-e-as-10-strategias-de-manipulacao-midiatica/

sábado, agosto 21, 2010

10 motivos para anular seu voto:

A cada dois anos a disputa entre elites e vanguardas políticas admite a necessidade de uma legitimidade mínima e inicia-se o período eleitoral. Diferente do discurso oficial que costuma apresentar duas vertentes centrais - cooptação eleitoreira ou anarcoidismo de quinta - apresentarei dez bons motivos para se deslegitimar a política institucional e seu processo eleitoral antidemocrático.

1. Votar significa legitimar um processo antidemocrático - ao participar optando por uma das opções apresentadas você legitima um mecanismo de controle de massas. Você reafirma sua própria coleira.

2. O Estado sai fortalecido - O Estado, mais que uma ferramenta organizativa, é uma super estrutura de hierarquia vertical instituída com o único objetivo de manter ricos no poder e pobres longe da riqueza produzida coletivamente. As eleições apenas fortalecem essa estrutura contribuindo para a reprodução da realidade desigual.

3. Não negocie com terroristas - O exército estatal mata milhares de pessoas brutalmente todos os anos! Manter essa estrutura é contribuir com o genocídio capitalista e com o terrorismo de estado. Não legitime meias verdades, vote nulo.

4. As opções não te contemplam - Ou contemplam? Você as construiu? Você decidiu as propostas? Ou apenas foi convencido do que é relevante para o país por agentes das lideranças partidárias?

5. As plataformas não foram construídas pela demanda real - Publicitários são contratados para criar a imagem certa e não para promover debates. As eleições não são espaços democráticos de debate, são momentos para construir-se figuras públicas partidárias (estrelismo político). São milhões gastos pelas elites e vanguardas em escritórios de especialistas em manipulação para determinar o que você deve fazer ou pensar. Não capitule, anule o voto.

6. Política Representativa é estratégia de controle - Será que existe representatividade? Existe alguém capaz de representar nossa individualidade decidindo como decidiríamos? Não. Isso não existe e só nós podemos escolher por nós mesmos. A República é o aparato que nos mantém longe das decisões sobre nossa própria vida. E aí, quem decide por você?

7. Votar não é direito e sim ferramenta de controle na conjuntura atual - O voto é uma ferramenta histórica da democracia, mas o voto obrigatório de milhões de pessoas sem direito à educação de qualidade, informação ou o básico para a subsistência é estratégia de controle pela miséria. Assim, quem tem a campanha mais colorida, popularesca e cara a ponto de ter evidência em todo o país sai na frente.

8. É injusto! - É inegável que o processo eleitoral é sórdido e fundamentado na injustiça. O Estado se apresenta como instituição onde a legitimidade é forçada pelo voto obrigatório de milhões de mulheres e homens sem comida forçados a reproduzir sua condição deplorável para manter as elites no poder até a próxima eleição e na próxima, e na próxima... É revoltante para qualquer um minimamente comprometido com a justiça.

9. Existem outras opções suprimidas pela política institucional - A força dos movimentos sociais e a importância do poder popular. A hierarquia horizontal e a autonomia federativa. Democracia direta e os colegiados com participação massiva da população. O fim da educação castradora e das imposições de mercado. A importância da ação direta de cada indivíduo em sua participação política nem ao menos são citadas. É sempre reproduzida a lógica que a tomada de decisões deve ser dos poderosos e letrados segundo a escola formal burguesa e que as massas devem calar-se reservando-se a participação política bienal através do voto republicano. Não acredite na falácia dos poderosos e demonstre isso anulando seu voto.

10. A república não é o limite da democracia - Uma estrutura representativa e fundamentada na desigualdade não é legítima ou democrática. O discurso da democracia possível é a desculpa da ideologia positivista para segregar explorados e exploradas à condição de subaltern@s na sociedade contemporânea. Não precisa ser assim, a história mostra regimes de hierarquia horizontal organizados como a Comuna de Paris e incontáveis Squats pelo mundo que assumem-se autonomamente enquanto território popular e libertário. Hoje ainda existem organizações e movimentos libertários como a Federação Anarquista e movimentos anti estatais diversos.

Vote nulo. Assuma um posicionamentos justo, libertário e comprometido com a construção de uma sociedade de tod@s.

quarta-feira, agosto 04, 2010

Recorta e cola IV

Moção de Repúdio contra a ação criminosa da Rede Globo em relação às mulheres que praticam aborto

É “fantástico” como a Rede Globo, ao longo dos últimos anos, tem cumprido um papel de afirmar e incrementar visões conservadoras na sociedade brasileira de forma geral, e de reafirmar a ideia do aborto como assassinato, em particular. As novelas da Globo têm sido o principal instrumento para veicular esta visão de aborto como crime e taxar as mulheres que o praticam de assassinas.

Não bastasse, esta emissora tem também assumido um papel policialesco, ao produzir reportagens para criminalizar e denunciar o aborto clandestino. Não podemos esquecer que o estouro de uma clínica no Mato Grosso do Sul, no final de 2007, que resultou na exposição pública do nome de dez mil mulheres e na condenação de trabalhadoras e de mulheres que fizeram aborto, foi desencadeada a partir da ação desta emissora, após denúncia feita contra a clínica.

A partir deste episódio, tem se desenvolvido no Brasil uma ação sem precedentes de criminalização do aborto. Inclusive com a proposta de uma CPI do aborto, contra a qual os movimentos têm lutado. Sabemos que a Rede Globo não está sozinha. Ela se articula com o setores mais conservadores da sociedade, que reúne parlamentares e igreja católica, com o intuito de retroceder nos poucos avanços que as mulheres conquistaram na área dos direitos reprodutivos.

Neste domingo, 1º de agosto, o programa Fantástico fez uma reportagem no mínimo revoltante. Em uma ação policialesca, entrou em clinicas clandestinas de Salvador, Belém e Rio de Janeiro para denunciar o aborto clandestino. Como sempre, foram expostas as mulheres pobres e as clínicas que atendem mulheres pobres, marcando assim o caráter de classe da criminalização do aborto. Por que não mostrou as clínicas em que as artistas e celebridades da Globo fazem abortos? Por que não mostrou os médicos as atendem? Ficou claro as mulheres ricas e as artistas da globo ficam preservadas, pois para elas o aborto não é problema, e nem é feito nestas clínicas.

Esta atuação da Globo somente reforça a já emblemática situação de criminalização instaurada no país. Sabemos que o aumento da repressão empurra as mulheres pobres para práticas de aborto cada vez mais inseguras, condenando-as a correr graves riscos para suas vidas, e para sua saúde física e psíquica. Além de não contribuir para reduzir este grave problema de saúde pública, alem de demarcar o lugar de subordinação das mulheres, já que elas não têm o direito de decidir sobre seus corpos e suas vidas.

É preciso lembrar sempre que são as mulheres pobres, negras e jovens, do campo e da periferia das cidades, as que mais sofrem com a criminalização. São elas que recorrem à clínicas clandestinas e a outros meios precários e inseguros, uma vez que não podem pagar pelo serviço clandestino na rede privada, que cobra altíssimos preços, nem podem viajar para países onde o aborto é legalizado, opções seguras para as mulheres ricas.

Diante de tudo isso, nós, mulheres da Marcha Mundial, vimos a público repudiar esta ação criminosa da Rede Globo contra as mulheres pobres que praticam aborto. Ao invés de punição, nós propomos para o Brasil uma política pública integral de saúde que auxilie mulheres e homens a adotarem um comportamento preventivo, que promova de forma universal o acesso a todos os meios de proteção à saúde, concepção e anticoncepção, sem coerção e com respeito. Somente a legalizaçao do aborto no Brasil é capaz de reverter a situação dramática da clandestinidade do aborto, que mata, humilha e pune as mulheres que ousam decidir por suas vidas.

Fazemos coro com os movimentos que lutam pela democratização dos meios de comunicação para dar um basta nesta postura criminosa, reacionária e autoritária da Rede Globo.

Fora Rede Globo! Basta de violência contra a mulher!

Pelo fim da criminalização das mulheres e pela legalização do aborto!

Marcha Mundial das Mulheres